Artigo alertando sobre a manipulação da mídia, encabeçada desde maio de 2007 pela rede Globo, contra a regulamentação quilombola atual. Para ir para o site clique no titúlo abaixo.
A mídia como ela é - grande imprensa assume o discurso de setores contrários à causa quilombola
Por Helena Costa*
A comunidade de remanescentes de quilombo que habita a ilha da Marambaia há mais de cem anos já resistiu a muitas ameaças. Até aqui enfrentou, não sem perdas, até mesmo a Marinha do Brasil - que com o tempo mudou seu perfil e passou de aparente benfeitora a algoz dissimulada.
Entretanto, uma nova ameaça às necessidades da comunidade toma vulto a chamada grande imprensa, em especial o jornal O Globo. O primeiro ataque forte aconteceu em fevereiro de 2005, quando o prefeito do Rio de Janeiro, César Maia, assinou artigo questionando a identidade dos quilombolas da Ilha. Obteve alguma repercussão, tanto pelo autor quanto pela infâmia defendida. Apesar disso, foi um texto singular, isolado, sem notícias seqüências que mantivessem a discussão, ou melhor a opinião do prefeito em destaque.
O que assistimos agora, de maio de 2007 pra cá configura uma estratégia articulada de ataque – não apenas à comunidade da Marambaia, mas aos quilombolas em geral. O Globo iniciou a artilharia pesada contra a Marambaia quando estampou uma foto deslumbrante da Ilha em sua edição dominical (a de maior vendagem) sob o título “risco de favelização”. Só isso seria suficiente para predispor qualquer leitor desatento contra os quilombolas, mas há outras sugestões indiretas de ilegitimidade, como referir-se aos habitantes da Ilha como “supostos” quilombolas e afirmar que eles reivindicam uma área equivalente a 70 Maracanãs – unidade de medida bastante imprecisa, mas eloqüente. Utilizava também um argumento precioso nestes tempos globalmente aquecidos a preservação daquele ecossistema, subitamente ameaçado por aqueles que dele cuidam há séculos.
Esta matéria d’ O Globo foi a primeira de uma série publicada ao longo daquela semana, e também abriu caminho para outras matérias e artigos contrários à comunidade (tendo como articulista agora um filósofo, reconhecidamente opositor dos movimentos sociais). O Jornal Nacional, da Rede Globo, acrescentou som e imagem ao discurso anti-quilombola e expandiu o alvo dos ataques fez matérias parcialíssimas atacando a comunidade de São Francisco do Paraguaçu, na Bahia. Semanas depois a Comunidade de Sacopã, da cidade do Rio, foi igualmente acusada de vilã ecológica, desta vez em nota numa "coluna cultural" do Segundo Caderno de O Globo, demonstrando que o assunto já alcança outras searas do jornal, tratado de maneira leviana, mas sempre reforçando uma imagem negativa dos quilombolas.
É certo que não é só a Marambaia que apanha, como também não é só a Globo que bate (numa rápida olhada no Observatório Quilombola observa-se o aumento de matérias nos últimos meses). Mas está claro que se trata aqui de um caso emblemático, para ambas as partes. Os quilombolas da ilha da Marambaia ousam resistir às imposições da Marinha apenas, nem mesmo à instituição (esquece-se também que não se reivindica, nem nunca se reivindicou a retirada do Cadim da Marambaia). Assim, tornam evidente o poderio militar que já se acreditava reduzido a lugar ordinário na conformação de engrenagens governamentais.
As organizações Globo, por sua vez, também demonstram que permanecem ao lado de poderosos -- ainda que permitam, para alegação futura de lisura, estarem abertos a várias versões de um mesmo caso. Resta saber se a Marambaia conseguirá, depois de resistir a senhores, feitores e comandantes, sobreviver tendo a mídia como opositora, e a Globo na linha de frente.
Helena Costa é jornalista e assistente de comunicação de KOINONIA.
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Muito axé e militância pessoal e obrigado pelos comentários.