segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

FREI DAVI DIZ QUE EMENDA TUCANA NÃO DESFIGURA PROJETO

Retirado do sie da Afropress.

Por: Redação - Fonte: Afropress - 21/12/2008

S. Paulo - Frei David Raimundo dos Santos, fundador e principal dirigente da Educafro, disse que o projeto de Lei que tramita no Senado - o PLC 180/08 –, com a emenda do deputado Paulo Renato (PSDB-SP) que introduziu o critério sócio-econômico, reservando 25% das vagas para estudantes de famílias com até 1,5 salários mínimos, não compromete a bandeira das cotas para negros e indígenas.

Ele também defendeu a necessidade de negociação em torno do tema. "Uma coisa é certa: nós negros/as precisamos entender que só com o voto deles ou com negociação venceremos. Quem é que tem o poder de negociar? Apenas os senadores. A nós militância cabe trabalhar previamente os senadores de nosso lado para que eles liderem o processo", disse em entrevista, por e-mail, ao editor de Afropress, jornalista Dojival Vieira.

Tramitação suspensa

Pela proposta que teve tramitação suspensa na última quinta-feira (18/12), 50% das vagas nas universidades federais e escolas técnicas passarão a ser preenchidas por estudantes da escola pública, sendo que 25% de famílias com renda de até 1,5 salário mínimo e 25% por auto-declarados negros e indígenas. "A emenda do Deputado Paulo Renato é mais favorável a nós negros do que ele próprio e muitos negros imaginam”, afirmou Frei David.

Na redação do projeto, porém, são garantidas vagas para pessoas auto-declaradas negras, pardas e indígenas, no mínimo, igual à proporção de negros, pardos e indígenas na população da unidade da federação onde está instalada a instituição, de acordo com o IBGE. Em apenas dois Estados, a presença da população negra é inferior a 25% – Rio Grande do Sul e Santa Catarina.

Frei David, entretanto, não vê nisso um problema. “Para a parte dos negros (pretos e pardos) isto não será difícil pois 73% do nosso povo infelizmente ganha até um salário mínimo”, afirmou.

O projeto deverá retornar ao plenário para votação só no ano que vem porque os senadores Demóstenes Torres (DEM-GO) e Ideli Salvatti (PT-SC) manifestaram-se contrários à redação enviada pela Câmara. Demóstenes é contra as cotas para negros e Ideli quer reinvindicar a paternidade da proposta e lembrou que é autora do PLS 546/07, que segundo ela deveria encabeçar as demais propostas.

É o possível

Frei David admite que “esta cota de vagas é muito abaixo do que é o nosso direito”. “No entanto é o máximo que a classe que tem o poder nas mãos está permitindo. Sabemos que temos juízo e maturidade para ir fazendo o avanço por etapa”, acrescentou.

Segundo ele, “os contrários às cotas estão cada vez mais articulados, ampliaram seus pontos de apoio na imprensa e na sociedade”. Ele, contudo, manifestou confiança em que o projeto retorne a plenário e seja votado até o dia 21 de março – Dia Internacional de Luta contra a Discriminação Racial.

Na audiência de quinta-feira (18/12), esteve presente o grupo de contrários às cotas, liderado pela antropóloga Yvonne Maggie, da UFRJ, José Carlos Miranda, do Movimento Negro Socialista e José Roberto Militão, da Comissão do Negro e Assuntos Anti-Discriminatórios da OAB/SP.

“Uma parte de nós que pudemos priorizar esta luta, adquirimos experiência em tramitação e hoje estou convicto de que se o movimento social se organizar um pouco mais, ele pode vencer em menos tempo, esta batalha aqui no Senado. Estamos trabalhando para conquistar esta vitória em 3 meses”, concluiu confiante.

Veja, na íntegra, a entrevista de Frei David

Afropress - Com a Emenda Paulo Renato não se cria uma outra cota de caráter econômico, com a exigência de rendimento até 1,5 salário mínimo per capita? Qual é afinal, o entendimento majoritário na redação confusa do projeto aprovado pela Câmara?

Frei David Raimundo dos Santos - O trâmite de qualquer projeto que fere interesses de setores bem instalados no poder é muito difícil. Os pobres e sem poder político são as grandes vítimas. Este desafio da inclusão do negro nas universidades está nas duas casas por mais de 30 anos. O projeto mais antigo, ainda não arquivado, é de 1999 de autoria da deputada Nice Lobão. Este tema já foi debatido e avaliado em dezenas de reuniões dos deputados e senadores. Em cada reunião um deputado ou senador faz seus retoques, conforme seus interesses.

É assim com todos os projetos e inclusive foi assim com a constituição que já sofreu mais de 60 emendas, após promulgada. Quando tem alguém da Comunidade Negra presente, consegue-se segurar e evitar retrocessos nos “retoques”. Pena que tem poucas entidades negras acompanhando estes projetos na frente de combate. Qualquer cidadão ou entidade pode e deve acompanhar e participar das reuniões. Se ele é alguém bem articulado, consegue que suas propostas sejam apresentadas por um dos deputados ou senadores presentes.

O deputado federal Paulo Renato, do PSDB, desde quando foi Ministro da Educação, posicionou-se contra todas as formas de Cotas. Ele, como toda a pessoa sábia, mudou de opinião e agora tem uma posição bem mais ampla e amadurecida. Já admite as Cotas para a rede pública e foi capaz de fazer negociação com todas as forças presentes e abrir mão de sua posição e deixar o corte étnico no projeto, desde que os defensores deste corte aceitassem incluir um corte de renda. Ele, como deputado tem o poder de segurar e atrapalhar um projeto que não lhe agrada. O único caminho é negociar.

Não se trata de outra Cota e sim na mesma de 50% trabalha-se também a questão da renda. Isto tanto na percentagem dos negros (segundo o IBGE) como na percentagem da rede pública, a metade deve ser destinada a pessoas que ganham até um salário mínimo e meio de renda per capita. Para a parte dos negros (pretos e pardos) isto não será difícil, pois 73% do nosso povo infelizmente ganham até um Salário Mínimo.

Queremos lembrar que a Educafro tem consciência de que estamos apenas começando a grande luta pela inclusão. Conforme o Jornal “Folha de São Paulo” aborda na reportagem deste domingo, dia 21/12/2008, as Cotas Étnicas não chegam a 5% do total de vagas disponíveis no sistema universitário brasileira.

Ora, nós somos 49,7% do povo do Brasil contra 49,3% dos eurodescendentes, logo, esta Cota de vagas é muito abaixo do que é o nosso direito. No entanto é o máximo que a classe que tem o poder nas mãos está permitindo. Sabemos que temos juízo e maturidade para ir fazendo o avanço por etapa. É bom lembrar que várias universidades que adotaram cotas estão culpando a militância afro por omissão, pois tem sobrado vagas para negros/as.

O corte sócio econômico do deputado Paulo Renato incidirá e provocará muito mais mudanças no perfil dos que seriam contemplados na rede pública. Com o corte vai ter vez os brancos pobres e muitos afros que não querem disputar uma vaga na corta étnica. A emenda do deputado Paulo Renato é mais favorável a nós negros do que ele próprio e muitos negros imaginam.

Afropress - O ministro Fernando Haddad e o Governo estão apoiando o projeto tal como está no Senado, daí ter se criado a possibilidade de sua votação ainda este ano?

Frei David - Acreditamos que além deles, outras forças boas estavam trabalhando com esta meta. Todos nós queríamos dar ao nosso povo afro, nestes 120 anos de Lei Áurea mais um degrau de oportunidade para mudar nossa realidade. Infelizmente os herdeiros da Casa Grande não permitiram. Continuamos a acreditar no amadurecimento da posição dos contrários. Assim como o Juiz Federal William Douglas que era contra agora ficou a favor, convencendo-se da importância desta proposta de inclusão afro, também vamos trabalhar pelo convencimento dos demais. Uma coisa é certa: nós negros/as precisamos entender que só com o voto deles ou com negociação venceremos. Quem é que tem o poder de negociar? Apenas os senadores. A nós militância cabe trabalhar previamente os senadores de nosso lado para que eles liderem o processo.

No entanto, cada senador tem uns trinta projetos de seu interesse para fazer passar no voto dos opositores. Ele negocia cada um já plantando comprometimento com os demais projetos. É tudo muito confuso e cheio de mil interesses. Alguns acham que o DEM está usando o nosso projeto (por ser de forte apelo popular) para conseguir barganhar seus interesses em outros projetos de outras áreas.

Afropress - O senhor concorda em que se retire o caráter de reparação das cotas e se assume o critério sócio-econômico? Por que?

Frei David - Não é justo falar isto. A emenda do deputado Paulo Renato é mais favorável a nós negros do que ele próprio e muitos negros imaginam. Quando ele exige que a metade seja para pessoas que ganham até um salário mínimo e meio, ele nos ajuda a evitar que os 37% de alunos da rede pública que vem da classe média, roubem todas as vagas de cotas de rede pública. Amplia a chance para mais afros entrarem. Como é do seu conhecimento, de cada 100 pessoas que terminam o ensino médio na rede pública, 37% são da classe média.

É o caso das centenas de municípios do interior que não possuem demanda para a implantação de uma escola particular. Assim os filhos dos vereadores, do prefeito, do Juiz, etc. são obrigados a estudar na escola pública. Esta escola tem qualidade! É dela que vêm 37% da classe média que ocupam as cotas de rede pública. No entanto, nós negros, por não termos poder político, tivemos que fazer nossas vitórias acontecerem usando como escudo a escola pública. Se não fosse o fato de termos pautado a escola pública como destinatária número um das cotas, não teríamos 10% das vitórias que já possuímos nas cotas étnicas.

Afropress - Por que fracassou a audiência de quarta-feira (17/12)?

Frei David - Porque o DEM, através do senador Demóstenes Torres de Goiás é contra as cotas para negros. Ele sabia que estávamos fortes na audiência e isto poderiam fazer a vitória vir para o nosso lado. Ela esteve muito perto de nós, se não fosse as manobras do DEM. Se um Senador propor tirar a cota para negro e deixar só rede pública, o senador Demóstenes deixará passar o projeto. Colamos em todos os senadores, amigos da população afros e pedimos que não permitam tamanha barbaridade.

Afropress - Faça, por gentileza, as considerações que julgar pertinentes sobre a matéria.

Frei David - Descontando as férias do Senado, planejamos e lutaremos para que, em três meses, (até 21 de março de 2009 - dia internacional de Luta contra todas as formas de desigualdade racial) conquistar e entregar as cotas ao nosso povo afro e indígena! Quem quiser nos ajudar neste desafio é só chegar no senado nas reuniões Da CCJ e ajudar a pautar este nosso direito.

Parabenizo os mais de 40 militantes da causa afro, de mais de 10 Estados do Brasil, que, de passagem, trabalhando ou morando em Brasília, ouviram ou leram o nosso apelo e vieram para o Senado nos ajudar na luta! Foi uma energia muito boa, principalmente o povo da Bahia e de Goiás que enfrentaram “o touro” à unha (Senadores de seus Estados).

Pegaram os Senadores nos corredores do Senado e exigiram posição de apoio ao projeto
ou iriam denunciar a omissão nos respectivos estados! É este o caminho! Cada grupo negro de cada estado poderia fazer o mesmo com o senador de seu estado, neste período em que eles estão nas suas bases eleitorais! Feliz Natal Afro e que 2009 seja rico em vitórias do nosso Povo Afro-Indígena!

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Muito axé e militância pessoal e obrigado pelos comentários.