sábado, 26 de setembro de 2009

A INCLUSÃO DIGITAL É UMA UTOPIA

Retirado do site da revista Isto É.


Eugênio Trivinho"A Inclusão Digital é Uma Utopia"Para especialista, constantes atualizações tecnológicas impostas pela indústria condenam o homem à eterna exclusãopor Ana Carolina Saito
INSEGURANÇA
Trivinho: “Aquele que hoje está incluído não tem o seu amanhã garantido na cibercultura”
O homem está condenado à exclusão digital. A afirmação parece um paradoxo diante dos inacreditáveis avanços tecnológicos da nossa época. No entanto, ela revela a lógica que se estabeleceu no mundo contemporâneo, a da velocidade. Não basta apenas ter acesso ao computador e saber informática. O ser humano precisa acompanhar constantemente as atualizações tecnológicas impostas pela indústria em uma incessante corrida para garantir sua permanência no ciberespaço. “A inclusão digital é uma utopia, um mito”, diz Eugênio Trivinho, professor do programa de estudos pós-graduados em comunicação e semiótica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Trivinho é autor do livro “A Dromocracia Cibercultural”. Dromo, do grego, significa velocidade, característica da época atual. O professor da PUCSP também organizou a recémlançada obra “Flagelos e Horizontes do Mundo em Rede: Política, Estética e Pensamento à Sombra do Pós-Humano”, que reúne ensaios de pesquisadores.
ISTOÉ – A internet pode ser considerada um veículo democrático?Trivinho – Do ponto de vista interno, a internet é democrática quando o acesso a todos os espaços é desimpedido. Nem sempre isso ocorre. Há senhas por questões de segurança e proibições. E por trás de uma senha pode existir um custo econômico, que seleciona os que podem e não podem. Do ponto de vista externo, a época exige conhecimentos específicos, que devem ser traduzidos em uma prática interativa, própria de um comportamento de contiguidade de acesso, de fluência e de rapidez. São conhecimentos pragmáticos para usar o hardware, o software e a rede, necessários para operar os dispositivos da era da velocidade.
ISTOÉ – Quais as consequências dessa exigência para a vida das pessoas?Trivinho – Como forma de pressão social, o sujeito precisa incorporar esses conhecimentos para ter um lugar ao sol na cibercultura, e não só no mercado de trabalho, mesmo para exercer cargos para os quais não é necessário saber informática. Para efeito de seleção exige-se esse conhecimento no currículo. A época requer não só conhecimentos convencionais, como a matemática, mas também o domínio de tecnologias. Isso pressupõe a incorporação de conhecimentos que não estavam disponíveis havia mais de 50 anos. É algo muito recente. É um cerco, como se a época dissesse: “Deves dominar esses conhecimentos, caso contrário o teu lugar ao sol na cibercultura está com o
s dias contados.”


ISTOÉ – É nesse sentido que a época atual se revela violenta?Trivinho – É uma violência simbólica, mas no sentido mais sutil. Não passa por símbolos, linguagem, palavras. O racismo se manifesta por palavras e gestos. A violência da cibercultura se realiza como pressão social, que vem de todos os lados e de lugar nenhum. O indivíduo sabe que não tem chances se não dominar as senhas infotécnicas: o computador, o protocolo de acesso, uma prática de continuidade e o conhecimento conforme a exigência da época. Existe ainda uma quinta senha que é uma das mais relevantes, a capacidade econômica e cognitiva de acompanhar as reciclagens estruturais dessas senhas.
ISTOÉ – O que são essas reciclagens?Trivinho – As indústrias frequentemente lançam hardwares que comportam capacidade de velocidade e de armazenamento diferentes. Quem não lembra do XT no início dos anos 90? Depois ele se transformou em 286, depois 386, 486, Pentium e assim por diante. Essa gramática numérica enseja um deslocamento do que chamo de mais potência do equipamento, do software, que acaba representando a mais potência do indivíduo, da própria cidadania. Essas senhas passam por uma reciclagem estrutural de tempos em tempos. É o discurso publicitário de que o que é lançado agora deve substituir o anterior porque é superior. Isso não é necessariamente verdadeiro, mas é uma lógica da cibercultura. E o drama social começa quando constatamos que essas senhas e o acompanhamento das reciclagens são um capital social que não é dado a todos.
ISTOÉ – A saída seria investir em políticas de inclusão digital?Trivinho – A inclusão digital é uma utopia, um mito. A inclusão social é um conceito mais abrangente. É a inclusão universal das pessoas. A inclusão digital não consegue se exercer dessa forma. Consegue apenas acontecer como inclusão de grupos de pessoas de uma determinada classe social. São grupos de idosos, não todos os idosos, de habitantes de uma periferia, não toda a periferia. A inclusão digital é impossível de se realizar como inclusão social plena.


PÁGINAS :: 1 2 3 4 Próxima >>

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Muito axé e militância pessoal e obrigado pelos comentários.