segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

MULHER NEGRA, SEM EMPREGO

Retirado do site do jornal Diário de Cuiabá.

DISCRIMINAÇÃO
Estudo do Ipea aponta parcela menos favorecida no mercado de trabalho, independente de escolaridade


Nilciléia, desempregada, acredita que falta de oportunidade profissional está ligada à sua cor



RENÊ DIÓZ

Especial para o Diário

Desempregada há 9 meses, Nilciléia Lemes, de 24 anos, acha que sua foto no currículo tem bastado para que os empregadores lhe recusem oportunidades. Ela possui o ensino médio completo, já foi operadora de caixa, recepcionista e babá. Fora um azar inexplicável, ela diz que não consegue cogitar outro motivo para as portas lhe fecharem a não ser a discriminação por sua raça. Afinal, insistência não tem faltado.
Ontem, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgou o estudo Retrato das Desigualdades de Gênero e Raça, cujos dados de 1993 a 2007, baseados na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), dão conta da situação de Nilciléia e das mulheres negras em geral no mercado de trabalho. É dentro deste recorte de gênero e raça que se encontra a maior taxa de desemprego e a menor renda média do país (veja quadro).
O curioso é que a mesma pesquisa aponta que as mulheres, brancas ou negras, estão cada vez mais escolarizadas, superando os homens de ambas as raças. E as negras acompanharam este progresso. De 1996 a 2007, diz o Ipea, elas aumentaram seu tempo de estudo de 5,2 para 7,4 anos. As brancas são as mais escolarizadas, com 9,3.
Enquanto se sustenta com o seguro-desemprego, Cleide Rodrigues Miranda, de 35 anos, está tendo de trabalhar como diarista esporadicamente para poder complementar a renda. Há um mês, ela foi dispensada do trabalho, uma empresa distribuidora de medicamentos que passou por um período de cortes de pessoal. Em sua casa, ela vive com o marido e três filhas e se prepara para “bater perna na rua”, em busca de uma oportunidade. Ela, que possui grande experiência como babá, espera que até a falta de escolarização (ela está concluindo o ensino médio) seja motivo para empregadores recusarem seus serviços, menos a cor de sua pele.
Mas a recusa ou a alegação de que não existem mais vagas disponíveis é uma resposta comum, mesmo para as mulheres com nível universitário. É isso o que assusta a professora Maria Lúcia Muller, coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Relações Raciais e Educação (Nepre) da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). Com a coleta de relatos para pesquisa qualitativa dentro da UFMT, o Nepre constatou que a raça tem sido fator decisivo para empregadores negarem oportunidades, mesmo quando ainda precisam.
Se o próprio Ipea prevê que o Brasil precisará de 87 anos para igualar as rendas de homens e mulheres, Muller acredita que o primeiro a se fazer é equiparar os salários de mulheres negras e brancas, preferidas no mercado mesmo quando não possuem formação tão consolidada. “O que preocupa é como se perpetua o imaginário ruim sobre a mulher negra”, aponta a coordenadora.
Este seria o segmento mais desfavorecido da sociedade no mercado de trabalho, diz a professora, enquanto as mulheres indígenas ainda não começarem a se emancipar com mais destaque. Já a presidente do Instituto de Mulheres Negras de Mato Grosso (Imune), a pedagoga Antonieta Luísa Costa, considera que as mulheres negras são “o segmento que mais avançou”, devido à consolidação das políticas afirmativas. Os movimentos negros, ela assegura, não aceitam o estigma do desfavorecimento social, focando-se na luta pela igualdade racial, mesmo que dados como os do Ipea, sem novidade alguma, traduzam periodicamente em números a injusta realidade das negras brasileiras.

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Muito axé e militância pessoal e obrigado pelos comentários.