Retirado do site do jornal Estado de São Paulo.
Camila de Magalhães
Publicação: 02/03/2010 08:18 Atualização: 02/03/2010
A Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) foi pioneira na adoção do sistema de cotas, em 2003. Cinco anos depois, foi sancionada a Lei Estadual nº 5.346/08, que estabelece as normas de ingresso em universidades do estado. A legislação prevê a reserva de 20% das vagas para negros e indígenas, 20% para alunos de escolas públicas e 5% para portadores de necessidades especiais e filhos de bombeiros e policiais mortos em serviço — desde que os candidatos sejam carentes.
Em 2009, o deputado estadual Flávio Bolsonaro (PP-RJ) ingressou com uma ação direta de inconstitucionalidade contra a lei. Mas a decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) foi pela manutenção do sistema. De acordo com a sub-reitora de graduação da Uerj, Lená Medeiros de Menezes, as cotas já foram absorvidas pelos estudantes. Hoje, 3.291 são matriculados por cotas raciais.
Ponto crítico
O sistema de cotas deve ser mantido e ampliado nas universidades brasileiras?
SIM
» Nelson Inocêncio
“Não há novidade nenhuma de que a nossa sociedade foi construída a partir de modelo injusto, pois contemplou alguns segmentos e desconsiderou vários outros. É impossível dizer que as oportunidades aqui no Brasil são as mesmas para os brasileiros. Os indicadores, na prática, mostram que somos uma sociedade desigual, inclusive no que diz respeito à população negra. Então, a intenção da política de cotas, por exemplo, é minimizar o dano provocado por esse modelo injusto de inclusão, que foi a base da formação da sociedade. Quando a gente trabalha com indicadores sociais, nos damos conta de que o negro é a maioria dos excluídos. Estamos num estado democrático de direito, mas a democracia se constrói a todo tempo e quando falamos das relações raciais, ela não demonstra ser democrática. A gente vê isso na representação dos brancos e a ausência de negros no poder. Os espaços privilegiados são ocupados 90% pelos brancos. E por que defender as cotas? Pois a educação é um caminho para formar cidadãos e a universidade pública também vive essa contradição, que é a de não conseguir contemplar os excluídos de um modo geral e por consequência não conseguir incluir a população negra de maneira, no mínimo, satisfatória. Então, a ideia da cota é a formação de uma elite negra no Brasil. Poucos ficaram incomodados com a formação da elite branca, não entendo esse desconforto com a elite negra. Vale lembrar também que quando falamos de negros e brancos não tem nada a ver com a visão sobre genética. A discussão que o movimento negro trava é em torno da representação das pessoas que são vistas como negras. A única intenção é visar uma sociedade mais democrática”
Coordenador do núcleo de estudos afro-brasileiros da UnB
NÃO
» Ibsen Noronha
“O meu ponto de vista se refere a um argumento recorrente dos que estão favoráveis às cotas, que é a dívida histórica que se tem para com os negros. Ora, quando se fala em dívida histórica se pensa na escravidão e nós temos que estudar a escravidão com um certo detalhe, pois ela é vista de maneira superficial. Isso porque, nós temos negros livres no Brasil desde o século 16. No século 17 aumentou esse número, inclusive alguns se tornaram nobres, por exemplo, na Batalha de Guararapes. No século 18 também temos muitos negros livres e no 19, tendo em vista que as leis de abolição da escravidão foram várias, aumentou esse número, a ponto de em 13 de maio de 1888 termos apenas 5% da população brasileira de escravos. Ora, se nós racionarmos historicamente, esses negros livres ingressaram na vida social e muitos tiveram escravos. Isso é comprovado e documentado pela história, de maneira que agora o meu raciocínio é o seguinte: se nós damos cotas hoje baseadas na raça, nós temos o perigo de cometer uma grande injustiça, pois sabemos que podemos dar uma vaga baseada na raça para um descendente de escravocrata. E nós vamos negar vaga para um branco que pode ser imigrante recente, por exemplo, um polonês, italiano ou ucraniano, que não tem nada a ver com esse problema histórico e vão ser lesados por ter uma cor. Além disso, existe um princípio de direito que atravessou séculos, que é o seguinte: dar a cada um o que é seu e não lesar a ninguém. Se nós lesamos alguém com essa política, não podemos considerar que há justiça”
Professor de história do direito do Instituto de Educação Superior de Brasília (Iesb
Em 2009, o deputado estadual Flávio Bolsonaro (PP-RJ) ingressou com uma ação direta de inconstitucionalidade contra a lei. Mas a decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) foi pela manutenção do sistema. De acordo com a sub-reitora de graduação da Uerj, Lená Medeiros de Menezes, as cotas já foram absorvidas pelos estudantes. Hoje, 3.291 são matriculados por cotas raciais.
Saiba mais...
STF inicia nesta quarta-feira debates que vão embasar decisão sobre reserva de vagas nas universidades
A briga na Justiça pelas vagas reservadas a cotistas — 10% raciais e 20% para alunos de escolas públicas — ainda é acirrada na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Candidatos que obtêm notas altas pelo sistema universal e não são aprovados por conta da reserva de vagas ingressam com cerca de 100 ações individuais ao ano.
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Ponto crítico
O sistema de cotas deve ser mantido e ampliado nas universidades brasileiras?
SIM
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“Não há novidade nenhuma de que a nossa sociedade foi construída a partir de modelo injusto, pois contemplou alguns segmentos e desconsiderou vários outros. É impossível dizer que as oportunidades aqui no Brasil são as mesmas para os brasileiros. Os indicadores, na prática, mostram que somos uma sociedade desigual, inclusive no que diz respeito à população negra. Então, a intenção da política de cotas, por exemplo, é minimizar o dano provocado por esse modelo injusto de inclusão, que foi a base da formação da sociedade. Quando a gente trabalha com indicadores sociais, nos damos conta de que o negro é a maioria dos excluídos. Estamos num estado democrático de direito, mas a democracia se constrói a todo tempo e quando falamos das relações raciais, ela não demonstra ser democrática. A gente vê isso na representação dos brancos e a ausência de negros no poder. Os espaços privilegiados são ocupados 90% pelos brancos. E por que defender as cotas? Pois a educação é um caminho para formar cidadãos e a universidade pública também vive essa contradição, que é a de não conseguir contemplar os excluídos de um modo geral e por consequência não conseguir incluir a população negra de maneira, no mínimo, satisfatória. Então, a ideia da cota é a formação de uma elite negra no Brasil. Poucos ficaram incomodados com a formação da elite branca, não entendo esse desconforto com a elite negra. Vale lembrar também que quando falamos de negros e brancos não tem nada a ver com a visão sobre genética. A discussão que o movimento negro trava é em torno da representação das pessoas que são vistas como negras. A única intenção é visar uma sociedade mais democrática”
Coordenador do núcleo de estudos afro-brasileiros da UnB
NÃO
» Ibsen Noronha
“O meu ponto de vista se refere a um argumento recorrente dos que estão favoráveis às cotas, que é a dívida histórica que se tem para com os negros. Ora, quando se fala em dívida histórica se pensa na escravidão e nós temos que estudar a escravidão com um certo detalhe, pois ela é vista de maneira superficial. Isso porque, nós temos negros livres no Brasil desde o século 16. No século 17 aumentou esse número, inclusive alguns se tornaram nobres, por exemplo, na Batalha de Guararapes. No século 18 também temos muitos negros livres e no 19, tendo em vista que as leis de abolição da escravidão foram várias, aumentou esse número, a ponto de em 13 de maio de 1888 termos apenas 5% da população brasileira de escravos. Ora, se nós racionarmos historicamente, esses negros livres ingressaram na vida social e muitos tiveram escravos. Isso é comprovado e documentado pela história, de maneira que agora o meu raciocínio é o seguinte: se nós damos cotas hoje baseadas na raça, nós temos o perigo de cometer uma grande injustiça, pois sabemos que podemos dar uma vaga baseada na raça para um descendente de escravocrata. E nós vamos negar vaga para um branco que pode ser imigrante recente, por exemplo, um polonês, italiano ou ucraniano, que não tem nada a ver com esse problema histórico e vão ser lesados por ter uma cor. Além disso, existe um princípio de direito que atravessou séculos, que é o seguinte: dar a cada um o que é seu e não lesar a ninguém. Se nós lesamos alguém com essa política, não podemos considerar que há justiça”
Professor de história do direito do Instituto de Educação Superior de Brasília (Iesb
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Muito axé e militância pessoal e obrigado pelos comentários.