sexta-feira, 10 de outubro de 2008

BRECHA NAS COTAS DA UFES FAZ CANDIDATA FURAR AS COTAS

Retirado do site do Jornal Gazeta.

Cotas na Ufes: aluna de escola particular consegue vaga
09/10/2008

Carla Nascimento, Elaine Vieira e Vilmara Fernandes

Uma brecha no sistema de cotas da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) abriu espaço para que estudantes de escolas particulares ocupem vagas que seriam destinadas aos de escolas públicas. Há pelo menos um caso confirmado: o de uma aluna que estudou todo o ensino médio em uma instituição privada e foi aprovada pela reserva de vagas para o curso de Direito.
Para ocupar uma vaga de cotista, ela inscreveu-se no Centro Estadual de Educação de Jovens e Adultos (Ceeja) ? público ? e obteve um segundo diploma, equivalente ao ensino médio. Foi esse certificado que ela apresentou para a universidade no momento da matrícula. Mas, em nenhum momento, declarou ter estudado em uma escola particular, como bolsista parcial.
A Ufes admite que não tem como verificar documentos ou informações omitidos na matrícula e diz que não pretende promover alterações na legislação de cotas, que gerou protestos e muita discussão antes de ser instituído, no VestUfes 2008, realizado no ano passado e no início deste ano. "A falha é da Secretaria Estadual de Educação (Sedu), que permite que um aluno que já tenha concluído o ensino médio faça supletivo", aponta o secretário de Inclusão Social da universidade, Antônio Carlos Moraes.
Já a Sedu argumenta que não pode privar ninguém de se matricular na educação pública. "Não há empecilho de fazer dois cursos de ensino médio. É como fazer duas faculdades", destaca a subsecretária de Educação, Adriana Sperandio.

Investigação
A situação da aluna está sendo investigada pelo Ministério Público Federal. Servidores do órgão vão avaliar se ela foi responsável por alguma fraude ou se praticou falsidade ideológica, o que pode resultar numa acusação criminal e até em prisão.
Já a Ufes vai enviar uma equipe do Serviço Social para visitar a casa da estudante. O objetivo é identificar se a declaração de renda apresentada pela jovem atende às exigências do sistema de cotas. Se isso não se confirmar, ela pode perder a vaga.
A estudante foi aprovada pelo sistema de cotas, para o segundo semestre deste ano, com uma nota de 78,27. Já os alunos que entraram pelo sistema universal, no mesmo curso, tiveram que obter nota mínima de 106,36.
A GAZETA não divulgou o nome da estudante, porque ainda não está comprovado se ela agiu de má-fé, e se há ilegalidade em seus atos

O que prevê o edital do VestUfes
3.2. Das vagas oferecidas para cada curso, 40% serão destinadas aos candidatos que atenderem ao seguinte perfil, cumulativamente, de acordo com a Resolução 33/2007 ? CEPE:
I. Ter cursado, no mínimo, quatro séries do ensino fundamental e todo o ensino médio ou curso equivalente em escola pública no Brasil; e (comprovar na inscrição)
II. Possuir renda familiar de até sete salários mínimos mensais na data de inscrição. (comprovar na matrícula)

Para efeito do que trata o inciso I (acima) não serão considerados nesta categoria candidatos que tenham estudado em escola particular, ainda que com bolsa de estudos integral e candidatos que tenham estudado em escolas comunitárias, filantrópicas e confessionais.
Jovem diz ter seguido lei, mas nem namorado sabia de curso Nem os amigos nem o namorado da estudante que freqüentou escola particular, mas foi aprovada pelo sistema de cotas para o curso de Direito sabiam que ela havia cursado um supletivo. A jovem temia a reação deles. Só a família tinha essas informações. "Não fiz nada errado. Vi a legislação, acompanhei as entrevistas do reitor e vi que estava previsto na lei. Eu tinha o diploma", relatou a estudante.
Ela contou à GAZETA que obteve seu diploma no supletivo em 2006, após ter sido aprovada na primeira fase do vestibular da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A Secretaria Estadual de Educação (Sedu) afirma que a inscrição para o curso foi feita em 20 de agosto de 2007, no mês em que a Ufes decidiu implantar a reserva de vagas. O registro da estudante foi publicado em 18 de janeiro deste ano.
A renda familiar da aluna também está sendo questionada. Ela alega que os pais, autônomos, recebem R$ 1.100,00. Nos três anos anteriores, foram eles que custearam a mensalidade de 50% do Darwin, de R$ 260,00. Bancavam ainda os demais custos da família, que vive numa casa em Jardim Camburi, Vitória. Outra curiosidade está em sua página do Orkut, em que revela gostar de surfar e mergulhar. E mostra, com fotos, uma viagem a Fernando de Noronha.

"Essa aluna foi uma menina esperta" , afirma universidade
"Não há nenhum problema no caso dessa aluna. Ela foi uma menina esperta", resume o secretário de Inclusão Social da Ufes, Antônio Carlos Moraes, sobre o caso da estudante de Direito que ingressou no curso utilizando o sistema de cotas, mas estudou em escola particular.
Moraes diz que, nesse caso específico, a documentação está correta, já que a estudante realmente prestou os exames do supletivo estadual, o Ceeja. "A Ufes não tem como checar se o aluno já completou o ensino médio em outra instituição. Cabe à Sedu fazer esse controle. Por outro lado, temos o critério da renda, e essa aluna apresentou a declaração de isento dos pais, que vai ser averiguada", destaca.
De acordo com o secretário, a Ufes já entrou em contato com a Sedu para buscar um meio de filtrar os interessados no Ceeja "provavelmente por uma questão social", aponta.
Mas a subsecretária de Estado da Educação Básica e Profissional, Adriana Sperandio, rebate, afirmando que a Sedu não pode impedir o acesso de ninguém ao supletivo. "A escola pública é direito de todos. Não podemos cercear isso", destaca.
Adriana aponta ainda que a Ufes é quem deve fiscalizar. "Essa não é uma questão estadual. A legislação é da Ufes e estabelece que alunos do Eja podem concorrer às cotas. Então, a Ufes é que deve verificar a documentação. No caso dessa menina, ela obedeceu a todos os critérios da lei", enfatiza a subsecretária.

Entenda como é o sistema de cotas
Reserva. Neste ano, o primeiro ano de implantação do sistema de cotas, cada curso reservou 40% de suas vagas no vestibular para alunos que saíram de escolas públicas e tinham renda familiar menor que sete salários mínimos (R$ 2.905,00)

Aumento. No próximo vestibular ? VestUfes 2009, cujas provas começarão no mês que vem ?, em 12 cursos houve um aumento de mais de 30% na oferta de vagas. A mudança era pré-requisito para a ampliação da reserva de vagas. Portanto em todos os cursos oferecidos em São Mateus, além de Medicina Veterinária, em Alegre, Arquivologia e Biblioteconomia Noturno, em Vitória, os ex-estudantes de escolas públicas terão 45% das cadeiras disponíveis

Disputa. Todos os inscritos vão disputar 60% das vagas. Uma vez ocupadas pela ordem de classificação, os ex-alunos de escolas públicas vão ter uma nova chance e serão reclassificados para ocupar os 40% de vagas reservadas

Pré-requisitos. O aluno precisa ter estudado pelo menos sete anos, incluindo todo o ensino médio, em escola pública para ser cotista. Na falta de candidatos com esse perfil, serão aceitos estudantes que cursaram todo o ensino médio e pelo menos uma série do ensino fundamental na rede pública. Se, mesmo assim, não houver candidatos com a pontuação mínima, as vagas reservadas serão remanejadas para os demais concorrentes, obedecendo a classificação por nota

Estratégia já atrai mais vestibulandos Foi no Darwin da Mata da Praia, em Vitória, que a estudante que se utilizou das cotas para ingressar no curso de Direito da Ufes cursou o ensino médio, nos anos de 2004 a 2006. Ontem, ao ser questionada sobre o assunto, a coordenadora do 3º ano da instituição, Helô Mannato, garantiu que toda a documentação da aluna está correta, incluindo o histórico do ensino fundamental, cursado na Escola Municipal Adevalni Sysesmundo Ferreira de Azevedo, em Jardim Camburi, também na Capital.
"Somos rigorosos com a documentação. Até para cursinho exigimos a conclusão do ensino médio. Ela, de fato, estudou aqui", diz Helô.

A jovem fez parte de um programa social voltado para alunos de escolas públicas que recebem bolsas no Darwin, cujos descontos variam de 50% a 100%. Dezenas de estudantes fazem parte do projeto. Alguns deles não foram aprovados no último vestibular da Ufes por não lançarem mão do sistema de cotas.
"O secretário de Inclusão Social da Ufes, Antônio Moraes, foi categórico ao afirmar, em diversas entrevistas, que bolsistas de escolas particulares não poderiam ser contemplados pelo sistema de cotas, porque estariam levando vantagem. Como admitem uma situação em que um estudante faça um supletivo e possa obter uma vaga por cotas? É uma incoerência", observou Helô.
Ela relata ainda que dezenas de estudantes já estão pensando em recorrer ao sistema de Educação de Jovens e Adultos para obter um segundo diploma, sem abrir mão de suas escolas, e assim garantir aprovação como cotistas.

Desempenho - 384 estudantes
Esse é o total de alunos que passaram pelo sistema de reserva de vagas e freqüentaram o primeiro semestre deste ano na Universidade Federal do Espírito Santo.
120 com notas dez Esse é o número de cotistas que tiveram pelo menos uma nota 10 no primeiro semestre cursado. Seu desempenho foi divulgado no início do mês passado.
84% de aprovação Essa foi a porcentagem de aprovação dos cotistas nas disciplinas ofertadas. No primeiro semestre, nenhum desses estudantes reprovou em 11 dos 37 cursos avaliados.
Vaga não poderá ser ocupada por suplente A Ufes vai averiguar a veracidade da declaração de renda feita pela aluna do curso de Direito que teria se utilizado da reserva de vagas mesmo tendo freqüentado escola particular. Caso seja verificada irregularidade nesse quesito, a estudante pode ser desligada da universidade, mas a vaga não poderá ser utilizada por outra pessoa. "O cotista que ficou logo depois dessa aluna na colocação vai sair prejudicado, mas ele pode acioná-la judicialmente", frisa o secretário de Inclusão Social da Ufes, Antônio Carlos Moraes. Ele diz que a verificação das declarações segue critérios como local de moradia e profissão dos pais, mas não soube informar se, no caso dessa aluna, houve visita do Serviço Social da Ufes.

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Muito axé e militância pessoal e obrigado pelos comentários.